Meus queridos irmãos,
Vivemos o primeiro Domingo da
Quaresma. Santa Quaresma! Tempo de perdoar e de amar. Amar como Jesus nos amou,
entregando-se à tirania de seus algozes, submetendo-se a humilhações e ao Lenho
da Cruz para a salvação da humanidade.
Refletimos hoje sobre a
conversão, linha mestra deste tempo admirável que é a Santa Quaresma.
A Restauração da humanidade é
feita em Cristo pelo batismo.
O mal tem muitas faces, mas uma
coerência inferior faz pensar num ser pessoal, embora não identificável no
mundo material. Chama-se Satanás, ou seja, adversário, ou ainda diabo, o destruidor.
O diabo está presente desde o início da humanidade. Parece, às vezes, que Deus
“solta as forças do mal”, por exemplo, quando ele permitiu que Satanás provasse
o justo Jô. As águas do dilúvio representavam, para os nossos antepassados, um
desencadeamento das forças do mal sobre a criação, o mundo dos homens. Deus
soltou Leviatã, o demônio das águas. Mas quem tem a última palavra, a palavra
final, na criação é o amor misericordioso de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Deus não quer destruir o homem,
por isso, imporá limites a Leviatã. Não mais voltará a destruir a terra,
conforme nos ensina a primeira Leitura. Ao final do dilúvio, Deus repete o dia
da criação, em que Ele
venceu o caos original, separou as águas de cima e as águas de baixo e deu um
lugar especial para o homem habitar. É uma nova criação que se realiza a partir
do dilúvio, seguida por um pacto de proteção. O belo arco-íris que alegra
generosamente todos os viventes, especialmente os homens, no fim do temporal, é
o sinal natural da aliança entre Deus e os homens. Oito pessoas foram
preservadas, na arca de Noé. Elas serão, graças à aliança entre Deus e os
homens, o início de uma nova humanidade.
Caros irmãos,
A Primeira Leitura(Gn 9,8-15) nos
apresenta o Dilúvio e a aliança com a humanidade. O dilúvio é o símbolo do
juízo de Deus sobre este mundo. Mas repousa sobre este, também, a sua
misericórdia, simbolizada pelo arco-íris. Deus faz uma aliança com Noé e a sua
descendência, isto é, a humanidade inteira. Apesar do mal, Deus não voltará a
destruir a humanidade. É significativo que esta mensagem foi codificada no
tempo do declínio do Reino de Judá. A fidelidade de Deus dura para sempre.
Irmãos e irmãs,
O primeiro domingo da Santa
Quaresma tem um Evangelho(cf. Mc 1,12-15) muito especial: aquela passagem que
relata o episódio das tentações de Jesus, antes de começar a sua vida pública
para pregar o Evangelho. Pode ser uma contradição para a compreensão humana
pensar que o Filho de Deus passe por tentações.
Tentação é sempre ligada a pecado
e como Jesus na tem pecado, achamos impossível ele ser tentado. Entretanto, até
para os santos a tentação é colocada para que sejam aprimoradas a nossa
confiança e a nossa perseverança em seguir Jesus Cristo.
O centro do Evangelho de hoje são
os homens e as mulheres redimidos por Jesus que restaura a humanidade pela sua
morte e ressurreição. Todos os homens permanecem em constante tentação: este é
o retrato dos humanos. No deserto, onde se passo o relato do Evangelho deste
dia, há o símbolo da natureza violentada, calcinada, amaldiçoada. Até a
natureza deve receber o Messias que vem reconduzir as criaturas ao sentido que
tinham na criação: obras boas saídas das mãos poderosas de Deus. Para elas,
Jesus traz a boa nova.
O extremo mais longe é o diabo. O
mais perto são os anjos, querubins e serafins. Entre os dois acontece a nossa
vida. Entre os dois se põe Nosso Senhor Jesus Cristo, participando da sorte
humana, dos animais e das plantas. O mais beneficiado é o homem e a mulher.
Meus irmãos,
Jesus exclama que “o tempo já se
cumpriu”. Isso significa não o fim do mundo, mas a inauguração de um novo tempo
de graça e de paz: o TEMPO DA SALVAÇÃO, momento da graça redentora. Terminamos
o momento de espera; começa-se o tempo de certeza, que não dispensa o esforço,
a conversão, a emenda de vida. Esse “hoje da salvação” não é o tempo histórico
de Jesus, mas sim o dia de hoje, o tempo de cada um de nós, o hoje de cada um
dos viventes.
Contudo, é necessário refletir ainda sobre o DESERTO. Todos os profetas se
preparavam no deserto. O deserto passou a ser o lugar onde se pode encontrar
Deus e tomar grandes decisões. E em Marcos, especialmente, é o lugar onde a
gente se encontra com Deus. Compreende-se, então, que Marcos faça Jesus - mais
santo que o profeta Elias, legislador maior do que Moisés, o Messias esperado -
como que nascer do deserto e vir do deserto para começar a pregação do
Evangelho. O DESERTO, entretanto, é
um lugar inóspito, símbolo de maldição, lugar de feras e demônios. E é nesse local
que o demônio vai tentar Jesus.
Nós, homens e mulheres, à imagem
e semelhança de Deus, estamos sempre ameaçados pelo demônio que quer que nós
vivamos no mundo do pecado e da maldição. E geralmente, quando atravessamos os
desertos de nossa existência, ele investe contra nós, tirando-nos a paz de
espírito, a tranqüilidade de consciência, a comunhão com Jesus Cristo. Por isso,
a grande mensagem de hoje é a volta do cristão para Deus, a volta do vivente –
homem e mulher – para Deus. Isso, porém, só acontecerá com a nossa conversão e
mudança de vida.
A Santa Igreja nos apresenta a
Quaresma santa, tempo de conversão, de mudança de vida e de amor em abundância. Santa
Quaresma é retorno para Deus, equilíbrio interior, vitória
sobre as tentações do maligno. Confirma-o a Sagrada Liturgia, ao entoar o cântico
que dá o colorido deste tempo: “Este é o tempo propício” (2Cor 6,2).
Jesus veio da terra dos pagãos.
Israel esperava um messias triunfalista, chefe militar, mas veio um filho de
carpinteiro, nascido na mais pérfida cidade de seu tempo. Isso nos leva a
concluir que não importa qual a nossa origem ou a nossa condição social ou
econômica. O importante é o nosso batismo. Pelo batismo, tornamo-nos cristãos e
aí não tem diferença: todos somos cidadãos do céu.
Neste sentido, anima a celebração
de hoje o espírito de confiança, acreditando que poderemos vencer o pecado e a
tentação pela graça de Deus: “Ele guia ao bom caminho os pecadores; aos
humildes conduz até o fim em seu amor”. Por esta razão, todos os batizados
devem renovar, na celebração da Páscoa, o compromisso de seu batismo: um
compromisso de coerência de vida, de anúncio do Evangelho e de engajamento na
nova Evangelização, superando todas as exclusões, como dos idosos, lutando
ainda para que todos tenham “o pão de trigo e o pão da palavra”, palavra que
liberta e salva!
Caros irmãos,
A Segunda Leitura(cf. 1Pd
3,18-22) nos apresenta o Dilúvio e o batismo. A Primeira Carta de Pedro
caracteriza-se por seu teor de catequese batismal. O batismo inclui a
transmissão do credo. Cristo morreu e desceu aos ínferos, ressuscitou, foi
exaltado ao lado de Deus, julgará vivos e mortos. Jesus tendo trilhado o nosso
caminho até a morte, nós podemos seguir seu caminho à vida. O batismo, antítipo
do dilúvio, purifica a consciência e nos orienta para onde Cristo nos precedeu.
Meus irmãos,
Conversão e batismo constituem as
duas linhas mestras da Quaresma. Pelo batismo, o ser humano mergulha, por sua
vez, na morte e ressurreição do Senhor Jesus. Este mergulho nas águas da vida
do batismo em Cristo exige, no entanto, a conversão, o compromisso solene de
uma boa consciência para com Deus. Conversão, fé na boa-nova do Cristo e
compromisso de vida nova constituem as linhas-força desta Quaresma que se
inicia.
Que todos nós possamos viver
intensamente este tempo de penitência, de jejum, de conversão e de oração. Que
a palavra divina seja sempre a santa referência fundamental a orientar a vida
cristã nas horas de provações e de dúvidas. Amém!
Padre Wagner Augusto Portugal
Vigário Judicial da
Diocese da Campanha, MG
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