“Vós
sois justo, Senhor, e justa é a vossa sentença; tratai o vosso segundo a vossa
misericórdia”(cf. Sl. 118,137.124).
Refletimos
na liturgia de hoje a “Igreja, comunidade
de salvação”. O profeta é o homem que enxerga por cima dos telhados, que
tem uma visão de conjunto da realidade eclesial, é aquele que faz uma análise
das coisas certas e das coisas erradas, anunciando a vontade de Deus, o hoje da
salvação. O profeta enxerga o lado interior das coisas, principalmente as
coisas surpresas e as maldades dos corações. O profeta é uma sentinela, que
deve dar o alerta se enxergar algo suspeito no comportamento dos fiéis e na
caminhada da comunidade. É o profeta que faz com que a comunidade volte para o
caminho da verdade, da salvação e da fraternidade. A primeira leitura tirada do
livro de Ezequiel(33, 7-9) nos adverte que como cristãos, temos todos
responsabilidades uns para com os outros. Somos sentinelas da fidelidade para
com Deus e para com o próximo. Os
profetas eram sentinelas em Israel; deviam dar alerta, e o fizeram. Mas o povo
não prestou atenção. Veio a catástrofe – exílio. Sobra um pequeno resto. Ainda
assim precisa de sentinela, de alguém que lhe avise para mudar seu caminho. E
aí da sentinela que não cumprir seu dever: ela é responsável pela perda do
irmão.
Irmãos e
Irmãs,
Jesus hoje
nos ensina como deve ser o comportamento cristão diante do pecador, de quem
peca, de cada um dos irmãos, que pecamos quotidianamente, na caminhada para a
santidade.
Jesus nos
adverte que a lei fundamental do cristianismo é a lei do amor, que tudo perdoa,
tudo acolhe, tudo ama. A correlação fraterna deve ser ditada pelo amor fraterno
e pressupõe a correspondente humildade e compreensão da parte de quem corrige.
O orgulhoso não tem autoridade para corrigir. O Evangelho fala da correção
fraterna, penitência e oração comunitária(cf. Mt 18,15-20). A Igreja é ao mesmo
tempo santa e pecadora. Na santidade de filhos de Deus, somos irmãos,
responsáveis uns pelos outros, mesmo e, sobretudo, quando o pecado está
destruindo esta santidade. Só em última instância, quando a preocupação do
cristão individual ou da comunidade nada resolvem, a comunidade pode excluir o
pecador, para o conscientizar de que ele já não está participando da santa
comunhão eclesial.
A ovelha
desgarrada é o pecador. Jesus se comporta diante do pecador de maneira
diferente da dos homens: vai à sua procura com interesse e carinho e sente
alegria em encontrar o pecador. Assim não foi com Zaqueu que desceu da árvore
para atender ao apelo convocatório do Mestre que dizia que iria hospedar-se na
sua casa, a casa de um pecador, anunciando que naquele dia a salvação havia
entrado na sua casa. Jesus nos aponta o comportamento correto dos cristãos: o perdão
e acolhida devem ser as maiores novidades do Novo Testamento. Mas amar, perdoar
e acolher é uma tarefa árdua, às vezes inatingível, porque o orgulho e a
auto-suficiência campeiam a mentalidade dos homens e das mulheres de nossos
dias.
Meus
irmãos,
O perdão é
difícil de entender e mais difícil de viver. O Antigo Testamento não conheceu o
perdão gratuito. Foi Jesus quem o trouxe, anunciou e viveu pela primeira vez na
sua própria vida. O Antigo Testamento ensinou a vingança, depois a lei de
talião, olho por olho, dente por dente. Entretanto, Jesus no sermão da Montanha
lembrou a norma jurídica e a declarou insuficiente e superada. Jesus virou a
mesa dando um passo significativo, muito adiante do seu tempo e do tempo em que
vivemos: Jesus instituiu o perdão gratuito, nunca olhando o tamanho da ofensa,
mas dimensionando o tamanho superior da acolhida e do perdão. Se Deus no céu
nos perdoa de todas as nossas infidelidades, quem seremos nós os homens para
não acolher esta diretiva de perdão, perdoar hoje, amanhã e sempre. Voltar ao
irmão que foi vilipendiado e abaixar-se se humilhando no perdão misericordioso.
Os cristãos tem o grave dever de ser “os mensageiros da reconciliação”, os
“mensageiros do perdão”. A Igreja, ao defender aos excluídos, deve ser a mensageira
no mundo da mensagem evangélica e do mandato apostólico do perdão e da
reconciliação. Jesus foi o próprio modelo de quem sabe perdoar gratuitamente.
Mesmo na Cruz, depois de tanto vilipêndio, injustiças e traições ele suplicou:
“Pai, perdoar-lhes, eles não sabem o que fazem”. E olhando para o ladrão
arrependido, São Dimas exclamou: “Hoje mesmos estarás comigo no paraíso” (Cf.
Lc 23,43), perdoando-lhe os seus pecados: “Os teus pecados te são perdoados”
(Cf. Lc 7,48).
Meus
amigos,
A
repreensão tem o sentimento e o gosto do perdão. Tudo isso por que o pecado,
mesmo cometido por uma só pessoa, tem sentido e significado comunitário. Por
que isso? Porque se corrigirmos um irmão individualmente, depois se ele não
aceita, é pedido que se chame a Igreja. Quando o Padre perdoa os pecados ele
age em nome da Igreja, agindo em nome de um poder que foi a ela confiada em
nome de Jesus Cristo. Dentro do cristianismo e repreensão já tem o gosto de
perdão. Está, portanto, muito longe de certo sadismo que sentem alguns que
vivem julgando todo mundo e se arrogam o direito de corrigir os da direita, os
da esquerda e os de trás, bem como os da frente. A repreensão significa
compreensão e coração dilatado para a abertura.
Nós
cristãos formamos uma comunidade. “Igreja” significa comunidade de crentes. Por
isso Jesus admitiu a possibilidade de duas ou mais pessoas terem de repreender,
quando alguém errou e não quis ouvir em particular uma reprimenda. Jesus fala
em “testemunhas” ao falar de correção. Ao falar em correção Jesus quis
resguardar que a Igreja não se transformasse numa seita de pequenos, mesquinhas
e puros, bem ao estilo dos judeus de então. Jesus não exclui, Jesus, ao
contrário, acolhe.
Amigos,
amados,
Jesus não
falou em nenhum momento em julgar. Ele apenas conjugou o verbo perdoar. O
perdão necessita de recolhimento, de intimidade com o Senhor, de enxergar o
hoje de Deus. A misericórdia de Deus ultrapassa todos os limites imagináveis da
justiça e se expressou no sangue do Filho bendito, derramado na cruz para o perdão
de nossos pecados, assim o nosso perdão, fundamentado no amor e embebido no
sangue do Senhor deve ir além da justiça humana e muito, muito além das
satisfações que nosso coração possa exigir.
Desenvolver
o senso de justiça sem perdão não adianta. A justiça é apanágio da acolhida e
do perdão.
Caros
Irmãos,
A segunda
Leitura(cf. Rm 13,8-10 nos ensina que Paulo, nas suas exortações resume a
prática da vida cristã não ficar devendo nada aos outros senão a caridade, que
é sempre insuficiente.
O amor é o pleno
cumprimento da Lei. Na sua justiça, Deus dá a todos o que precisam:
fundamentalmente, seu amor de Pai. Nós, para sermos justos, devemos também
dar-nos mutuamente este dom, embora sempre ficaremos devendo. Toda a justiça
está incluída nisso.
Pois a caridade
é o resumo de tudo. Vamos nesta semana refletir e colocar em prática a caridade
que é o resumo da liturgia de hoje. Se nos esforçamos pela caridade salvamos
automaticamente todas as outras obrigações: “O amor é pleno cumprimento da lei”
(cf. Rm 23,8-10).
O
verdadeiro amor não deixa as pessoas como são, com seus defeitos e as suas
limitações. Amar um irmão significa ajudá-lo a crescer em todos os níveis,
querer concretamente a sua libertação, daquilo que é defeituoso e mau, lutar
por sua plena humanização. Corrigir é a grande obra de amor. Na correção
fraterna o cristão faz largo uso do encorajamento. Corrigir o irmão para os
caminhos de Deus é uma das maiores facetas da caridade.
Padre
Wagner Augusto Portugal
Vigário Judicial da Diocese
da Campanha, MG.
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